*Por Carlos Góes
Imagine que você tenha feito uma aposta com seu vizinho. Ele cobraria dois reais e lhe daria 10 reais se você conseguisse tirar coroa três vezes seguidas ao jogar uma moeda. Ao mesmo tempo, um outro vizinho lhe propõe a possibilidade de ganhar os mesmos 10 reais, mas você precisaria tirar coroa três vezes dentre seis tentativas. Você certamente escolheria a segunda proposta! Mas, e se o primeiro vizinho subisse a recompensa para 30 reais?! Talvez você se dispusesse a enfrentar mais riscos de perder... para ter a chance de ganhar mais. Essa é uma das máximas de finanças.
O que isso tudo tem a ver com a atual polêmica sobre a Calourada da UnB? Bem, o DCE modificou o modelo de gestão da Calourada para esse ano. Até o ano passado, os CAs agiam como capitalistas de risco[§]: entravam com um investimento inicial e arcavam com os altos riscos do capital depreendido. Embora tenham tido retorno no primeiro ano do modelo, no ano passado os CAs tiveram um significante prejuízo – o que evidencia a volatilidade do investimento.
Esse ano, o DCE tinha de tomar uma decisão: manter o modelo de alto risco ou procurar um novo modelo? Acertadamente, o DCE optou por um investimento mais conservador, que minimiza riscos. No total, o movimento estudantil ficará com 10% das receitas brutas mais 45% dos excedentes primários, o que totaliza mais da metade do total, sem precisar entrar com um centavo de investimento. Esse modelo é vantajoso pois permite que CAs sem fundos participem e, no caso de o evento dar prejuízo, garante que os CAs serão os únicos a receberem qualquer quantia. Por essa razão, desafio qualquer pessoa a justificar, com retornos suficientemente maiores que os já robustos volumes esperados, a modificação de um investimento de risco zero para outro de risco total.
Mais do que isso, cabem algumas perguntas... Deve o movimento estudantil da UnB atuar como um capitalista de risco, como defendem os membros das gestões passadas? Ou deve ele ser conservador em seus movimentos, minimizando risco e garantindo com maior certeza os recursos necessários ao financiamento de suas atividades representativas? Deve a Calourada ser um evento para benefício de alguns poucos, assumindo-se riscos simplesmente para treinar mão de obra qualificada para a gestão futura de eventos no DF, como era feito no passado? Ou deve ela servir para garantir a maior diversão de todos os estudantes, trazendo grandes atrações, como o Bloco do Sargento Pimenta[*] e Banda Uó[**]?
Chame-me de idealista, mas eu entendo que, para as funções acadêmicas e representativas do movimento estudantil, não é necessário mais do que algum dinheiro, criatividade, disposição e competência. Também não é conveniente que as festas se tornem o fim último do movimento estudantil ou que estas transformem-se em programas de trainee para futuros promoters de Brasília, subsidiados com dinheiro dos CAs e do DCE. Nada mais acertado, portanto, do que garantir um fluxo certo de recursos para os CAs, enquanto, concomitantemente, assegura-se um evento com ótimas atrações a preços razoáveis[∞] para todos os estudantes da UnB. Devem ser eles, todos os estudantes, e não somente os militantes do movimento estudantil, a terem seus interesses representados pelo DCE.
Sobre a Calourada deste ano, minha análise é de que ela é um péssimo negócio para as pessoas que decidiram assumir os riscos – eles devem ser muito depreendidos dos ganhos materiais, pois são péssimos homines oeconomici. Sob o ponto de vista financeiro, posso afirmar peremptoriamente: os riscos, esses sim, foram eliminados. E isso é ótimo para os CAs e para o DCE.
*Carlos Góes é Mestrando em Economia Internacional (com especialização em Finanças Internacionais) pela Universidade Johns Hopkins; Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília; e Geronte da Aliança pela Liberdade.
[§]No jargão de finanças: venture capitalists - aqueles que investem em “start-ups”, empresas ou projetos de retorno incerto – e, portanto, muito arriscado.
[*]Banda que toca Beatles em forma de marchinhas de carnaval, escolhida para ser a atração musical a tocar para o príncipe britânico em sua recente visita ao Brasil.
[**]Banda vencedora do Video Music Brasil, da MTV, em 2011
[∞] Dois shows a R$15,00 no Plano Piloto, sério?! Recordo, ainda, que estudantes Grupo I e II ganharão entradas para a Calourada promovida pela Gestão Aliança pela Liberdade.
ANEXO - MINI-ANÁLISE FINANCEIRA DA NOVA CALOURADA
(Esses números são ilustrativos e razoavelmente arbitrários. Eles servem basicamente para demostrar para o leitor interessado a diferença entre dois cenários: com e sem excedentes. Antes de dizer que é uma simplificação, saiba que essa mini-análise é isso mesmo: uma simplificação. Mas ela enfatiza as vantagens do modelo apresentado)
Modelo
(I) - COM EXCEDENTES |
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Receitas Brutas: |
R$458,250.00 |
10% para os CAs: |
R$(45,825.00) |
Custo
Logístico e de Bens Vendidos |
R$(120,000.00) |
Excedentes Primários |
R$292,425.00 |
Custos Operacionais (Investidor Externo) |
R$(160,833.75) |
Excedentes Líquidos |
R$131,591.25 |
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Total para o ME |
R$177,416.25 |
DCE |
R$58,485.00
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Cas |
R$104,310.00 |
Fundo Institucional |
R$14,621.25
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Modelo (II) - SEM
EXCEDENTES |
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Receitas Brutas: |
R$120,000.00 |
10% para os CAs: |
R$(12,000.00) |
Custo
Logístico e de Bens Vendidos |
R$(120,000.00) |
Excedentes Primários |
R$(12,000.00) |
Prejuízo para Investidor Externo |
R$(12,000.00) |
Excedentes Líquidos |
R$0,00 |
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Total para o ME |
R$12,000.00
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DCE |
R$0,00 |
Cas |
R$12,000.00
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Fundo Institucional |
R$0,00 |